O ano em que a Nova República completou 30 anos não deixará saudade. Acreditamos que o país se encontra em um ponto de inflexão que, nos próximos dois ou três anos, dependendo das nossas escolhas, definirá nossa jornada 30 anos para frente. Afinal, que país desejamos ter em 2045? Um país ainda com um capitalismo de compadres e detentor de instituições extrativistas ou o de um país dinâmico, moderno, com uma economia de mercado saudável e com instituições inclusivas[1], como nos ensinam os economistas Acemoglu e Robison?[2]
Finalizamos o ano presos na armadilha da estagflação, um fenômeno comum no século passado bem conhecido por nós, isto é, estagnação/recessão da atividade econômica com inflação elevada. As expectativas para 2016 também não são nada animadoras, mas diante desse estado da natureza inevitável, que tal buscarmos soluções e aproveitarmos a crise para fazermos um amplo exame de consciência coletiva?
Mais do que nunca, diante desse cenário negativo de queda abrupta da atividade econômica, os gestores públicos deverão dormir e acordar pensando em como melhorar a governança. Logicamente, é mais “fácil” governar com dinheiro, mas quando não tem, é hora de o gestor mostrar seu lado de empreendedor público competente e criativo. Não é tarefa trivial. Mas quem disse que a vida pública é uma missão fácil?
A filosofia é um bom remédio nesses momentos de incerteza, angústia e pessimismo. Ela estimula a nossa capacidade de refletir com sabedoria, além de nos ajudar a formular as perguntas corretas, fundamentais para a maior resolutividade das tomadas de decisões.
Existem alguns “deveres de casa” para os gestores em contextos de crises. Sem pretender esgotar a matéria, seguem alguns: planejar e dar transparência aos seus atos; governar com parcimônia; escolher as políticas públicas prioritárias; disseminar na sua equipe a postura da simplicidade e da criatividade ao buscar soluções, p.ex., conversando com gestores experientes e bem sucedidos em outros tempos e/ou lugares.
A autossuficiência, o isolamento, a centralização decisória e o improviso são comportamentos que levarão, seguramente, ao caos gerencial. Nenhum indivíduo, município, estado ou país está condenado ao fracasso, mas, também, o sucesso não é garantido se não fizermos as opções corretas ao longo do tempo.
Desde 1985, com a redemocratização e posteriormente com a consolidação da democracia, provamos que temos capacidade de construir instituições inclusivas. De lá para cá muitas foram as conquistas possibilitadas a partir da nova Constituição Federal: a abertura da economia brasileira, a estabilidade monetária, as políticas de transferência de renda são algumas delas.
E nós, controle externo, com o que podemos contribuir nesse processo de superação da crise e do desenvolvimento institucional? Façamos nosso próprio exame de consciência. O que temos a ver com tudo isso que aí está? Enxergamos, basicamente, duas possibilidades. Fazendo uso de uma analogia futebolística, podemos assistir ao jogo do banco de reservas ou participar dentro do campo e ser um dos principais jogadores.
A primeira possibilidade é ficar na zona de conforto, fazendo o feijão com arroz, com ar de paisagem para a crise e para a sociedade, no estilo “deixa a vida me levar”, como canta um sambista famoso. A segunda possibilidade é ser um agente catalisador e disseminador de boas práticas de governança, pensar fora da caixa, ousar no nosso trabalho indo além da mesmice cotidiana burocrática, plugada no automático: análises meramente formais das prestações de contas, por exemplo, auditorias ordinárias pouco aprofundadas, pautadas apenas pelo princípio da legalidade como grande e única fonte de inspiração das nossas análises.
Claro que podemos mais. É só olharmos para a qualidade do nosso quadro de servidores. Temos que dar o exemplo e quebrar paradigmas, repensar processos caducos de trabalho, revolucionar o uso de ferramentas da tecnologia de informação e, sobretudo, focar no resultado para que a sociedade compreenda a razão da nossa existência. A legitimidade do nosso trabalho depende disso!
O Plano Estratégico, recém-formulado, será o nosso GPS para atravessarmos essa crise e chegarmos em 2020 alcançando a visão almejada que é “ser reconhecido como instrumento de cidadania”.
Sim, nós podemos! Um feliz 2016 para todos!
Sebastião Carlos Ranna de Macedo – Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo
Luís Filipe Vellozo de Sá – Auditor de Controle Externo do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo
[1] Instituições econômicas inclusivas são aquelas que permitem que a riqueza seja disseminada pela sociedade, enquanto instituições econômicas extrativistas são aquelas que concentram a renda em uma elite privilegiada. Embora breves surtos de crescimento econômico sejam possíveis na vigência de instituições extrativistas, o desenvolvimento só será sustentável na presença de instituições econômicas inclusivas. Instituições políticas extrativistas temem a inovação econômica e a “destruição criativa” provocada pelas instituições econômicas inclusivas.
[2]ACEMOGLU, Daron; ROBINSON, James. Por Que As Nações Fracassam: As Origens do Poder, Prosperidade e da pobreza. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012.
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