O Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo (TCE-ES) acolheu o recurso do ex-presidente da Câmara Municipal de Aracruz, Ronaldo Modonesi Cuzzuol, sobre o julgamento da Prestação de Contas Anual do exercício de 2012 do Legislativo do município, julgando as contas como regulares com ressalva, e retirando a aplicação de multa do então gestor. O ex-parlamentar recorreu do acórdão que havia sido julgado pela Primeira Câmara, no qual as contas haviam sido consideradas irregulares.
O recurso foi julgado na sessão virtual do Plenário, da última quinta-feira (24), acompanhando o voto do relator, conselheiro Sérgio Borges.
A condenação de Cuzzuol, realizada em 2019, ocorreu por ter sido identificada irregularidade em sua prestação de contas, devido ao pagamento indevido de gratificação a servidores de cargo comissionado. Os servidores eram lotados nos Recursos Humanos, e recebiam a gratificação por participar de comissões especiais de trabalho, no caso, a Comissão de Desenvolvimento funcional.
A Corte havia considerado que teria ocorrido uma duplicidade de pagamento, pois no caso em questão, as atividades desenvolvidas pelos servidores na Comissão de Desenvolvimento funcional tratavam-se trabalho rotineiro da Administração, com a respectiva remuneração para o desempenho da função. Além disso, haveria vedação de exercício de função em comissão especial, por parte de servidor que exerce unicamente de cargo comissionado, conforme o Estatuto dos servidores.
No entanto, na análise do relator do Recurso, o colegiado entendeu que a Lei municipal 2.897/2006 (Plano de Cargos e Carreiras da Prefeitura Municipal de Aracruz), e a Lei 3529/2011, que trouxe alterações à primeira, faziam referência expressa ao fato de que os serviços prestados nas comissões demandavam o pagamento da gratificação, tanto para servidores efetivos e comissionados, e eram de natureza prevista no ordenamento interno.
“É fácil de se notar que o responsável agiu acreditando estar sob o manto da legalidade, isto é, observando a previsão legal instituída pela própria Administração – e aqui não entrarei no mérito de a norma estar ou não equivocada – atuando conforme o que lhe era ordenado. (…) Exigir do agente conduta diversa não me parece razoável diante do cenário que se apresentava. Destaco tal fato pois a essência da questão posta em debate nos conduz a julgar o caso conforme as práticas e normas previstas a época dos acontecimentos”, avaliou o relator.
O conselheiro também argumentou que o órgão julgador deve considerar, portanto, não somente a literalidade das normas que o administrador tenha infringido, mas deve considerar conjuntamente a estes atos as dificuldades práticas enfrentadas e que possam justificar de forma razoável tal violação, hipótese que se amolda inteiramente ao caso.
“A gestão pública envolve especificidades que devem ser consideradas pelo julgador para a produção de decisões justas, corretas e proporcionais”, afirmou.
Ao analisar a Lei 3529/2011, a área técnica defendeu que ela deve ser revista para deixar de trazer norma inconstitucional, passando a ter validade formal e material.
Isso porque essa lei inclui os servidores comissionados entre aqueles que poderiam participar de comissões especiais de trabalho, de maneira a poderem receber gratificações por tal participação em até duas comissões, o que é uma possibilidade incompatível com o texto constitucional, com a essência dos cargos em comissão e com a jurisprudência pátria.
A área técnica apontou que o Supremo Tribunal Federal (STF) já consolidou, em Repercussão Geral, que os cargos comissionados só se justificam para o exercício de funções de chefia, direção e assessoramento, sendo incompatíveis com o desempenho de atividades burocráticas, técnicas ou operacionais, e por isso, a possibilidade de cargos comissionados cumularem suas funções com outras é inviável.
Em relação a esta questão, o relator acompanhou a área técnica e realizou recomendações.
Determinações
Por entender que o então presidente da Câmara agiu com boa-fé e conforme as normas previstas, seguindo aquilo que lhe era ordenado, não vislumbrando a possibilidade de lhe exigir conduta diversa, o relator votou para que haja o afastamento da irregularidade na prestação de contas de 2012 da Câmara de Aracruz, e que as mesmas sejam julgadas regulares com ressalvas.
Também foi recomendado ao atual gestor da Câmara Municipal de Aracruz, bem como ao Chefe do Executivo e à Procuradoria Geral do Município e da Câmara Municipal de Aracruz, que sejam tomadas as providências cabíveis para a devida constitucionalização da Lei Municipal 3529/2011, ou seja, que ela seja revista, retirando o conteúdo que está em desacordo com a Constituição.
Processo TC 14408/2019
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