A sustentabilidade fiscal tem que ser um compromisso permanente (presente e futuro) que garanta finanças públicas equilibradas (receitas e despesas). A probabilidade de ocorrência de um risco e/ou o seu impacto na ação governamental enseja uma atuação do TCE-ES. 

O preço do barril de petróleo é uma variável extremamente volátil, instável num mercado internacional sujeito a diversas intempéries, com grande perda no peso na arrecadação do Estado (de 8,9% da receita arrecadada em 2022 para 4,7% em 2023) e na Receita Corrente Líquida (de 10,1% em 2022 para 5,5% em 2023), não devendo servir de lastro para a realização de despesas permanentes. 

Legislação 

Atualmente, há a tentativa de acordo entre os estados no litígio da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4917, medida proposta pela presidência do STF. A ação contesta nova distribuição dos royalties, que foi estabelecida pela Lei nº 12.734/2012. 

Até então, os estados e municípios produtores recebiam a maior fatia desses valores como compensação aos possíveis danos ambientais da exploração do petróleo. Com a lei, os recursos arrecadados passariam a ser distribuídos a todos os estados e municípios da federação, mesmo os que não produzem petróleo. 

A definição pela Suprema Corte sobre a constitucionalidade dos dispositivos da Lei pode gerar perdas pretéritas ao Estado do Espírito Santo, de cerca de R$ 3,71 bilhões, e aos municípios capixabas, de R$ 4,90 bilhões, no montante total de R$ 8,61 bilhões, referente aos anos de 2013-2019.  

Pode gerar também perdas futuras ao Estado do Espírito Santo na ordem de R$ 4,85 bilhões, e aos municípios capixabas de R$ 5 bilhões, chegando ao montante total de R$ 9,85 bilhões, relativas aos anos de 2020-2025 (valores reais, a preços de 2019). 

Ao retirar os militares do ES-Previdência, o Estado fez opção de instituir um novo regime de repartição simples, operado de forma perene, em contrapartida a um regime de capitalização, que seria equilibrado no curto e no longo prazo, o que representa uma ação com potencial risco para a gestão fiscal do Estado.  

O Fundo possui um déficit atuarial de R$ 14 bilhões, que representa a necessidade de aporte com recursos do Tesouro, no longo prazo. Com isso, o resultado previdenciário negativo será crescente até o ano de 2084, assim como a necessidade de aporte, prosseguida de leve estabilização do resultado negativo até o final deste século. 

O TCE-ES já recomendou ao chefe do Poder Executivo a adoção de medidas compensatórias em face da criação do Fundo de Proteção Social dos Militares (FPS), tendo em vista a necessidade de criação de novas fontes de recursos para custeio do plano, em benefício da preservação do equilíbrio de curto e longo prazo das contas públicas. 

Os “Precatórios da Trimestralidade” são oriundos de uma lei inconstitucional, segundo recentes julgados do STF, por se tratar de norma que concedeu reajuste automático aos servidores públicos. Eles já estão reconhecidos no passivo do Estado na conta “Provisões para Riscos Trabalhistas a Longo Prazo”. 

Em 2015, o TCE-ES realizou Termo de Cooperação Técnica com o Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) e com a Procuradoria Geral do Estado para estabelecer fórmula de cálculo para os precatórios da trimestralidade. A fórmula visa reparar as gravíssimas distorções encontradas nas correções dos precatórios.  

Elaborada a partir do trabalho diligente e imparcial dos auditores de controle externo do TCE-ES, essa metodologia apontou os parâmetros, índices e limites temporais para apuração das diferenças ocasionadas pelo reajuste trimestral da inflação e suas repercussões na remuneração, tendo sido aprovada pelo TJES.  

Vícios 

Contudo, nas petições de três entidades de classe (Associação dos Procuradores do Estado do Espírito Santo, Associação Recreativa dos Sargentos e Subtenentes da Polícia Militar e Bombeiros Militares do Estado e Sindicato e Servidores Públicos do Estado), o minucioso trabalho do corpo técnico do TCE-ES foi completamente ignorado e os valores apresentados violaram frontalmente a correta metodologia de cálculo elaborada pela Corte de Contas. 

Nas petições em discussão, o desprezo pela aplicação do correto método de correção deu asas ao surgimento de valores absurdamente inflados e irreais, na avaliação do TCE-ES. 

Na ótica das finanças públicas, os graves vícios nos cálculos desses trinta precatórios dizem respeito ao mais relevante debate jurídico da atualidade no Espírito Santo, visto que representam uma ameaça letal ao equilíbrio das contas públicas estaduais nas próximas décadas e, por consequência, um prenúncio de dolorosa crise econômica e social. 

Se não forem extirpados definitivamente os vícios insanáveis da metodologia de cálculo dos valores de tais precatórios em questão, eles provocarão, sem rodeios, a “falência” do Espírito Santo, atualmente um dos estados mais sólidos do Brasil do ponto de vista fiscal. 

“Um pequeno grupo pode enriquecer indevidamente à custa do sofrimento de milhões de capixabas, que, por muitas décadas, padecerão com serviços públicos precários nas áreas de saúde, educação, segurança e assistência social, para ficar apenas em alguns exemplos. Pois a responsabilidade social de um estado depende fundamentalmente de sua solidez fiscal”, registra o Parecer Prévio do TCE-ES na PCA do governador do Espírito Santo referente a 2023. 

Julgados 

Recentemente, o Supremo Tribunal Federal (STF) proferiu diversas decisões relativizando a coisa julgada e desconstituindo precatórios da trimestralidade (por exemplo, Recursos Extraordinários 1.370.312, 1.383.608, 1.339.777, 1.381.479, 1.401.584, 1.339.781). 

Nessas decisões, o STF vem reconhecendo a flagrante inconstitucionalidade da lei e das decisões que embasaram os referidos precatórios, de modo que o trânsito em julgado – e consequentemente os pagamentos dele decorrentes – não pode prevalecer.  

A respeito da posição da Suprema Corte em um desses processos, o Ministro Gilmar Mendes registrou, em seu voto-vogal: “Não custa relembrar que o reajuste com base no IPC (índice de correção monetária nacional) era taxativa e reiteradamente reconhecido como inconstitucional pelo Supremo Tribunal em diversas oportunidades. Pouco importa qual seria a periodicidade: mensal, bimestral, trimestral, quadrimestral, anual etc. Era pacífico, em inúmeros precedentes, ser vedado o reajuste automático com base em índice de correção monetária federal, por descumprir a necessidade de reserva legal para fixação de vencimentos, pelo menos desde 1982”.  

Com a reforma, o Estado do Espírito Santo é um dos entes estaduais que mais perdem. Ao deslocar a cobrança do tributo da origem (produção) para o destino (consumo), a reforma quebra um rol de políticas públicas capixabas, estrategicamente elaboradas, ao longo de anos, com a concessão de benefícios fiscais para atrair e para reter empresas e produção. Junta-se a isso o fato de o Estado ser eminentemente produtor, com baixa densidade demográfica e com mercado consumidor reduzido. 

 

Em 2023, o Estado registrou um resultado primário negativo de R$ 468.685.147,17, suportado por créditos suplementares no valor de R$ 4.345.975.171,31 (fonte de recurso – superávit financeiro de exercícios anteriores), após 8 anos de resultados superavitários.  

A análise do Tribunal de Contas identificou o uso expressivo de recursos de exercícios anteriores (superávit financeiro), que não são receitas do exercício de 2023, para fazer frente a despesas primárias de 2023, especialmente, investimentos, o que distorce o sentido do resultado primário negativo. 

A avaliação também considerou outros indicadores, como: 

– resultado nominal (R$ 178.707.989,07) maior que o primário (-R$ 468.685.147,17); 
– resultado orçamentário superavitário (R$ 797.621.960,70);  
– dívida consolidada líquida negativa (-6,64%);  
– aumento da disponibilidade de caixa;  
– trajetória descendente das dívidas bruta e líquida em relação à receita corrente líquida;  
– novamente, nota A na Capag (12 anos seguidos);  
– relação “despesa corrente x receita corrente” favorável (80,05%); 
– e Indicador de Vulnerabilidade Fiscal para o Estado com baixa vulnerabilidade entre os anos 2020 e 2023. 

Nesse contexto, para o TCE-ES, pode-se afirmar que a situação fiscal do Estado é estável. Contudo, no que concerne à tendência dos resultados, o Estado não deve aumentar o patamar das despesas com base em receitas não recorrentes.